Um relatório do Supremo Tribunal Federal (STF) de janeiro deste ano apontou que 371 haviam sido condenadas por crimes relacionados ao episódio
Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil
“É por elas, é pelos seus netos, é pelos seus filhos, é por justiça, é pelo nosso Brasil e pelo nosso futuro. No próximo domingo, dia 16, às 10 da manhã, compareça. Vá a Copacabana. É por todos nós.” Assim o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) convocou sua militância para uma manifestação em Copacabana, no Rio de Janeiro, pela anistia a pessoas envolvidas na invasão das sedes dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023.
O protesto acontece ao mesmo tempo em que a bancada bolsonarista no Congresso Nacional tenta acelerar a votação de um projeto de lei que prevê a anistia para pessoas envolvidas nos atos de 8 de janeiro.
Um relatório do Supremo Tribunal Federal (STF) de janeiro deste ano apontou que 371 haviam sido condenadas por crimes relacionados ao episódio. Outras 527 teriam admitido a prática de crimes relacionados e feito acordos com o Ministério Público Federal (MPF) para não serem processadas.
A convocação feita pelo ex-presidente faz parte de um vídeo com a foto de quase uma dezena de mulheres condenadas por seus envolvimentos no episódio. No vídeo, porém, Bolsonaro não cita que uma possível aprovação do projeto da anistia poderia, sim, beneficiá-lo diretamente.
É o que afirmam juristas ouvidos pela BBC News Brasil que avaliaram o projeto. Segundo eles, o texto prevê a anistia para pessoas direta ou indiretamente envolvidas no 8 de janeiro e até mesmo por atos anteriores.
Isso, em tese, beneficiaria Bolsonaro, apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como o suposto líder de uma organização que teria tentado dar um golpe de Estado que teria culminado com o 8 de janeiro.
Bolsonaro é acusado crimes como de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
Mas o que diz exatamente o projeto de anistia e quais as chances de ser aprovado?
A BBC News Brasil questionou juristas, políticos e cientistas políticos para responder a estas perguntas e explicar como a anistia aos presos pelo 8 de janeiro pode, sim, favorecer também o ex-presidente.
O que diz o projeto?
O projeto de lei mais avançado de anistia ao 8 de janeiro é de autoria do ex-deputado federal Major Vitor Hugo (PL-GO), um dos principais aliados de Bolsonaro durante seu governo.
O PL 2.858 foi apresentado em novembro de 2022 e, inicialmente, tinha o objetivo de anistiar manifestantes que teriam participado de protestos no dia 30 de outubro, após a derrota de Bolsonaro no segundo turno das eleições daquele ano.
Naquela ocasião, manifestantes contra a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) bloquearam rodovias impedindo a circulação de pessoas e automóveis em diversas partes do Brasil, o que gerou uma série de prisões. Em 2023, os parlamentares mudaram o projeto para anistiar também quem participou do 8 de janeiro. O projeto, em síntese, prevê o seguinte:
- Anistia a todos que apoiaram ou financiaram e participaram direta ou indiretamente dos atos de 8 de janeiro de 2023, em atividades relacionadas antes ou depois dos protestos;
- A medida também beneficiaria quem fez mobilizações em redes sociais em prol dos atos;
- A anistia se aplicaria a todos já julgados ou quem ainda esteja sendo julgado, com extinção da pena de todas as pessoas já condenadas;
- Mudanças no Código Penal, como a exigência de que seja caracterizado o uso de violência grave contra pessoas nos casos em que suspeitos são processados por tentativa de abolição do Estado democrático de direito;
- Manutenção dos direitos políticos dos condenados ou investigados;
O projeto chegou a tramitar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados no ano passado, mas não foi votado.
Tribuna da Bahia